Por: Rose Aielo Blanco*
A fama foi chegando devagar e, de repente, as maravilhas da linhaça começaram a ganhar destaque nos meios de comunicação
Semente de uma planta muito antiga e bem conhecida – o linho – a linhaça é atualmente considerada um alimento funcional. Isso porque, além das suas propriedades nutricionais básicas, ela tem função protetora da saúde, graças aos seus compostos antioxidantes e anticancerígenos.
Um dos trabalhos que parece comprovar esta afirmação foi apresentado durante o 6° Simpósio Latino-Americano de Ciência de Alimentos, que aconteceu na Universidade Estadual de Campinas, no interior de São Paulo em meados de 2009. O estudo realizado pela cientista Lilian Thompson, da Universidade de Toronto, no Canadá, comprovou que a linhaça foi capaz de deter a metástase em pacientes com câncer de mama, evitando que o tumor se espalhasse pelo organismo. Segundo explicou a pesquisadora, "trabalhos realizados em várias universidades mostram também que a semente é capaz de diminuir o risco de outros tumores, como o de cólon e o de próstata".
O incrível é que esta sementinha quase milagrosa vem acompanhando a humanidade desde os seus primórdios!
Ninguém sabe determinar ao certo desde quando o linho começou a ser cultivado. Várias fontes que pesquisei indicam que ele era utilizado por povos pré-históricos de algumas regiões da Europa Central, mas há registros de seu cultivo no Egito há cerca de 2500 anos a.C.
Provas do uso de suas fibras para confeccionar tecidos pelos egípcios é que não faltam: descobertas arqueológicas comprovam que os egípcios envolviam as múmias em tecido de puro linho. Ele entrava quase na etapa final do processo de mumificação, quando o corpo era envolvido em faixas de linho branco. Nesta etapa, os egípcios colocavam entre as faixas os amuletos de proteção para o morto levar em sua jornada. Foram encontradas múmias que continham cerca de 100 amuletos entre estas faixas de linho.
Imagina só a resistência da fibra à ação do tempo! A tumba do faraó Ramsés II – mumificado em 1213 a.C - foi descoberta em 1881 d.C e o detalhe é que quase 3 mil anos depois, o tecido de linho que envolvia a múmia estava em ótimo estado de conservação.
Na Bíblia também não faltam referências ao linho. Campos de linho foram literalmente devorados por gafanhotos numa das pragas do Egito. Símbolo de pureza, era o tecido usado pelos sacerdotes em seus serviços religiosos. A lei regia que tanto os sacerdotes judaicos, como os egípcios deviam usar vestimenta de linho. Até mesmo o Santo Sudário – manto ou lençol que teria envolvido o corpo de Jesus após a crucificação -, segundo os defensores de sua autenticidade, era confeccionado em linho puro.
Depois que caiu nas graças dos romanos, ficou fácil para o linho propagar-se por toda a Europa. Pela facilidade em fiar, tingir e tecê-lo, passou a ser cultivado em muitas partes do mundo, até mais ou menos a metade do século XIX, quando a cultura do algodão ganhou ascensão.
Antigos gregos e romanos já usavam a semente do linho na culinária. Ambos os povos louvavam os benefícios da linhaça para a saúde. Mas a popularidade do linho e sua semente foi decaindo junto com o Império Romano.
A linhaça só atrairia os holofotes novamente por volta do século VIII, quando o imperador francês, Carlos Magno, impressionado com suas propriedades nutricionais e medicinais, resolveu decretar por lei que todo o povo deveria consumir a linhaça para o bem da saúde. E com isso, o cultivo do linho tornou-se obrigatório na região.
Carlos Magno estava pondo em prática algo que já havia sido descrito no século V a.C. por Teofrasto, que indicou a linhaça como remédio na sua “História das Plantas”, e por Dioscórides, no século I d.C. Botânico e médico grego, Dioscórides escreveu em sua obra “De Matéria Medica” que a linhaça era indicada até para tratar queimaduras de sol. Há também referências de seu uso na milenar medicina ayurvédica, de origem indiana.
O linho, a linhaça
Originário da Ásia, o linho (Linum usitatissimum L.) é uma planta herbácea da família das Lináceas, que pode atingir de 30 cm a 1 m de altura. Suas folhas, pequenas e lanceoladas, são dispostas de forma alternada. Já as flores apresentam cinco pétalas e são hermafroditas, surgindo nas cores azuis ou violáceas. Os frutos são cápsulas que contêm várias sementes ovaladas, muito ricas em substâncias oleaginosas.
O processo de transformação do linho em tecido envolve várias etapas, começando pela decomposição do caule, que é posto de molho em água por alguns dias para separação das fibras; em seguida vem a maceração, quando são retiradas as fibras das hastes, depois vem a fiação e por fim a tecelagem.
No Brasil, o linho foi introduzido no início do século XVII, no estado de Santa Catarina, e foi para outros estados como São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul. O Canadá, país onde a planta também chegou no mesmo século, é o principal produtor mundial de linhaça. Estados Unidos, Argentina e Índia também cultivam o linho como planta oleaginosa.
Sim, a semente do linho é a linhaça!
Rica em proteínas, minerais e vitaminas, a semente de linhaça contém cerca de 40% de óleo em sua composição. Abundante em Ômega 3 e Ômega 6, numa proporção harmônica, o óleo de linhaça ajuda a garantir a saúde cardiovascular, pois atua na redução do LDL, o mau colesterol. Além disso, a altíssima taxa de Ômega 3 faz da linhaça um alimento extremamente benéfico à saúde, pois trata-se de um importante agente antioxidante e renovador celular.
Diversos estudos apontam para outro valioso benefício desta semente e, neste caso, as maiores beneficiadas são as mulheres. Isso porque a linhaça também é a maior fonte alimentar de lignana, um fitoesteróide de ação semelhante à do estrógeno. Os especialistas chamam a lignana de “fitoestrógeno” pois, ao se ligar a receptores celulares, a lignana funciona como um “falso hormônio”, muito útil no período da menopausa, quando as taxas desse homônio caem bruscamente. Ou seja, ela funciona como um agente natural de reposição hormonal. Essa propriedade também tem se mostrado muito útil para aliviar os temidos sintomas da TPM – Tensão Pré-Menstrual.
Os estudos com um grande número de pacientes realizados pela pesquisadora canadense, Lilian Thompson, citada no início desta matéria, mostram a relação entre a lignana e a redução dos tumores de mama. Esse composto atua na apoptose celular, um mecanismo de defesa que provoca uma espécie de suicídio das células defeituosas. "Foi observado esse efeito em 39 pacientes", declara a pesquisadora, que as orientou a consumir 25 gramas de linhaça por dia durante pouco mais de um mês.
A linhaça é também fonte de vitaminas B1, B2, C, E, caroteno, ferro, zinco, potássio, magnésio, fósforo e cálcio, além de contar com uma alta taxa de fibras solúveis, especialmente benéficas para o bom funcionamento do intestino. A ingestão diária do farelo de linhaça auxilia na redução da taxa de açúcar no sangue dos diabéticos. Mas não é só: segundo o Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, o farelo de linhaça pode ser considerado um alimento preventivo do câncer de mama, da próstata, do cólon e do pulmão.
A dose ideal
Existem dois tipos de semente de linhaça: a dourada, cultivada em regiões mais frias, e a marrom, cultivada em locais de clima quente e úmido. Em termos nutricionais elas não apresentam grandes diferenças, mas a semente de linhaça dourada possui a casca mais fina e seu sabor é um pouco mais suave.
Apesar de muito benéfica, não devemos exagerar no consumo da poderosa semente – alíás, como de qualquer semente oleaginosa (linhaça, girassol, gergelim, castanha-do-pará, castanha de caju, semente de abóbora, entre outras). A maioria dos especialistas concorda que a dose diária segura é de 1 a 2 colheres (sopa) para os adultos e 1 colher de sobremesa para as crianças.
A linhaça pode ser consumida na forma de semente, farinha ou farelo e também em cápsulas preparadas com o óleo de linhaça. As sementes são utilizadas em iogurtes, saladas, sucos, vitaminas, misturada a cereais, massas de pães, bolos, etc. A farinha de linhaça pode ser adquirida já pronta ou preparada em casa (basta triturar as sementes de linhaça no liquidificador, usando a tecla pulsar) e misturada a sucos, vitaminas, iogurte ou salpicada nas refeições, frutas e sobremesas.
Podemos aproveitar melhor os seus benefícios consumindo a semente de linhaça moída. Isso porque a casca da linhaça é resistente à digestão no trato gastrointestinal, assim, a semente inteira pode passar direto pelo organismo, o que reduz suas vantagens nutricionais.
E ainda ajuda a emagrecer!
Um estudo realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ –, ainda antes de ser concluído, indicou que a farinha de linhaça ajuda a controlar a fome. O trabalho mostrou uma redução no apetite entre 15 e 45 minutos após a primeira refeição do dia que incluía a linhaça. Segundo informações da Associação Brasileira de Nutrologia, por ser rica em fibras, a linhaça aumenta a saciedade, e ainda fornece substâncias que estimulam a produção de um hormônio controlador do apetite.
Por tudo isso e também por ajudar a controlar os níveis de colesterol, especialistas têm recomendado a inclusão da linhaça na alimentação das pessoas em tratamento contra a obesidade.
Curiosidades sobre o linho e a linhaça
* Durante a Idade Média o linho foi usado como forma de pagamento aos abades e também dos dízimos das igrejas.
* Em Portugal, até meados do século XIX, o dote das noivas era avaliado pelo número de “teias” (tecido) de linho que possuíam.
* Seu nome científico - Linum usitatissimum – significa “muito usado”. Existe também o Linum catharticum L., mais conhecido como linho-purgante, usado para fins medicinais.
Esta variedade contém um glicosídio chamado linina, que apresenta efeito purgante.
* O óleo de linhaça é usado na fabricação de tintas e vernizes.
* Ainda na Idade Média, acreditava-se que as flores do linho serviam como uma espécie de amuleto contra a feitiçaria.
* Povos antigos acreditavam que a planta de linho era protegida pela deusa Hulda, da mitologia nórdica, padroeira da tecelagem, que teria ensinado às mulheres o cultivo e o uso do linho.
*Foram encontrados desenhos da linhaça em tumbas egípcias datadas de período anterior a Cristo.
* O linho é um cereal de origem, mas em alguns países é cultivado como planta oleaginosa, já que produz bastante óleo. Mas há quem tente até definir a planta como leguminosa, por apresentar proteínas semelhantes às das espécies dessa categoria.
* Os maoris da Nova Zelândia faziam amplo uso do linho, tecendo-o para fabricar artigos domésticos e também aproveitando suas propriedades medicinais.
* No século XVIII costumava-se preparar a “água de linho”, usando várias partes da planta. A bebida era uma espécie de panacéia para conservar a saúde.